Diagnóstico de uma doença rara na vida adulta: o relato de Maíra
Por Maíra Kiefer, jornalista
Aos 44 anos, sete meses e 17 dias, por mais de uma hora perdi a consciência após duas convulsões tônico-clônicas em sequência. Elas se iniciaram logo após o término de uma reunião de trabalho. A cena, que insistentemente recrio volta e meia quando repenso no diagnóstico e nas consequências, deixou marcas em mim, nos meus familiares e nos que me socorreram em 6 de maio, evitando que o pior ocorresse.
Nenhum sinal nos dias que antecederam a crise. Apenas o estranhamento dos colegas ao verem que a mais prolixa do grupo calara-se durante toda a conversa, deixando escapar algumas risadas fora de contexto. Esse era o primeiro sinal do AVC hemorrágico.
CAVERNOMA - Passada uma hora do episódio, acordei na emergência, ao lado do meu marido e cercada de médicos e enfermeiros. Não sei ao certo se me falaram da crise convulsiva naquele instante ou se a mencionaram como desmaio, mas as dúvidas sobre o que desencadeou tudo seriam sanadas quatro horas depois, após a tomografia e a ressonância. De nome estranho e até então desconhecido para mim, o cavernoma, localizado na parte frontal esquerda do meu cérebro, respondia a tudo o que se sucedera naquela terça-feira de 2025. Considerada uma doença rara, o cavernoma é descrito como uma malformação vascular que produz vasos anormais no cérebro. A anormalidade possui prevalência de 1 a 5 casos a cada 10 mil pessoas.
CIRURGIA - Nenhuma sequela, apenas cansaço e alguns breves esquecimentos. Enquanto não decidisse fazer a operação indicada pelo neurocirurgião, deveria tomar anticonvulsivante. Nos oito dias que passei no hospital, foram utilizados dois: fenitoína, à qual não respondi bem, com uma espécie de ressonância no corpo, e levetiracetam, que utilizo até hoje. Avaliei e reavaliei muitas vezes os prós e contras da operação. Consultei outro médico, com entendimento diferente, mais conservador, que prefere observar a evolução do caso. Nova ressonância: redução de um centímetro em um dos eixos da lesão e desaparecimento do edema.
MEDOS - As boas notícias não afastam os temores por completo. Deixei de dirigir para proteger meus filhos, que andavam comigo, e outros motoristas e pedestres. Mesmo sem convulsões, outro episódio de rompimento de algum vaso capilar que compõe o angioma cavernoso pode ocorrer.
A lesão pode estar comigo desde sempre. Não deu indicativos: nenhuma dor de cabeça, nem desmaio. Há dias e dias. Uns como antes, e outros de certo medo. Optei por fazer duas sessões de terapia semanais, sem medicações, para abrandar a ansiedade e a tristeza, potencializadas um pouco pela medicação para as convulsões. Por querer saber mais sobre a doença, me inscrevi no site Aliança Cavernoma. Soube da Casa dos Raros, da Casa Hunter e do Conexões Raras. Descobri que escasso era o meu conhecimento sobre as inúmeras doenças escondidas pelas estatísticas.
Acredito que, em breve, tanto a minha quanto outras enfermidades deixarão de ser incuráveis. Curiosamente, a palavra raras, se invertida, resulta em sarar. E é a esse verbo que me apego.
