Pesquisador se diz otimista quanto pesquisas para Síndrome de Phelan-McDermid
A Síndrome de Phelan-McDermid, também conhecida como Síndrome 22q13, representa um dos muitos desafios do campo das doenças raras. De origem genética, a condição é causada por alterações na extremidade do braço longo do cromossomo 22, impactando diretamente no funcionamento do gene SHANK3, fundamental para a comunicação entre neurônios. As manifestações clínicas incluem atraso global no desenvolvimento, hipotonia neonatal (fraqueza muscular desde o nascimento), dificuldades na aquisição da fala e comportamentos associados ao transtorno do espectro autista. “É uma síndrome que exige exames genéticos específicos para ser diagnosticada, como o cariótipo ou técnicas mais sensíveis como MLPA (técnica utilizada para identificar deleções ou duplicações em áreas específicas de um gene ou cromossoma)”, explica Guilherme Baldo, coordenador de pesquisas da Casa dos Raros, referência nacional em doenças genéticas. “Por afetar um gene crucial no funcionamento sináptico, ela gera um quadro clínico bastante complexo e variável, o que dificulta o diagnóstico precoce”, observa.
ESPERANÇA - As limitações terapêuticas atuais não significam falta de esperança. Pesquisas internacionais já avançam com testes clínicos de terapia gênica voltados à Síndrome de Phelan-McDermid. A estratégia consiste na entrega de uma cópia funcional do gene SHANK3 diretamente no cérebro dos pacientes por meio de um vetor viral, o AAV9, o mesmo utilizado na terapia para a Atrofia Muscular Espinhal (AME), outra doença genética grave. Baldo esclarece que, “no caso de Phelan-McDermid, a meta é fazer com que o gene entregue pelo vetor passe a produzir a proteína ausente nos neurônios, corrigindo parte do déficit funcional”.
BARREIRAS - Apesar dos avanços globais, o cenário nacional ainda enfrenta dificuldades. “No Brasil, a pesquisa sobre essa condição é limitada por uma soma de fatores como escassez de financiamento, falta de modelos celulares e animais, e obstáculos estruturais para o desenvolvimento de terapias avançadas”, afirma Baldo. Ele aponta que, fora do país, o apoio de associações de pacientes e investimentos filantrópicos têm acelerado os estudos.
Ainda assim, há motivos para otimismo. Centros como a Casa dos Raros e universidades públicas vêm desempenhando papel fundamental. “Temos, sim, infraestrutura para diagnosticar e iniciar estudos sobre doenças como a Phelan-McDermid. A padronização de exames, desenvolvimento de novas técnicas e formação de profissionais são passos essenciais e possíveis aqui”, ressalta Baldo. “As universidades também são o ponto de partida para terapias inovadoras, o que acaba atraindo depois o interesse da indústria farmacêutica”, observa.
APRENDIZADOS - Com vasta experiência em doenças lisossômicas, Baldo vê paralelos importantes entre diferentes patologias raras. “Cada avanço terapêutico para uma condição rara abre portas para outras. O uso do AAV9, por exemplo, mostra como uma tecnologia bem-sucedida em uma doença pode ser adaptada para outra, trocando-se apenas o gene transportado”, analisa.
Essa lógica de “casos de sucesso” inspira novas estratégias e acelera a inovação. Além disso, segundo Baldo, o uso crescente de inteligência artificial pode melhorar significativamente o tempo até o diagnóstico, aumentando a janela de eficácia para futuras terapias.
FUTURO - Para Guilherme Baldo, o futuro da biotecnologia nas doenças raras é animador. “Estamos vivendo uma revolução. A combinação de diagnóstico genético mais acessível, inteligência artificial, terapias gênicas e edição genômica pode transformar completamente o prognóstico de condições como a Phelan-McDermid”, acredita.
O coordenador de pesquisas da Casa dos Raros garante que cientistas, médicos, pacientes, familiares, governo e indústria têm objetivos alinhados: diagnóstico precoce e tratamento eficaz. “E, pela primeira vez, temos ferramentas reais para tornar isso possível”, finaliza.
“Cada avanço terapêutico para uma condição rara abre portas para outras"